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DEU RUIM: Janja recebe duro castigo após falar sobre os env… Ver mais

Janja e evangélicas: encontro revela fissura entre discurso e fé

O recente encontro da primeira-dama Janja da Silva com um grupo de mulheres evangélicas, na Bahia, escancarou uma das tensões mais latentes do governo Lula: a dificuldade em dialogar de forma eficaz com o crescente eleitorado evangélico. Ao apostar em uma narrativa de empoderamento feminino e enfrentamento à opressão, Janja encontrou resistência entre lideranças religiosas que enxergam na fé cristã, e não no ativismo político, a verdadeira força transformadora. A recepção fria ao seu discurso escancarou um desencontro entre proposta e percepção.


“Tudo posso naquele que me fortalece”: a resposta das igrejas

A reação de parte das mulheres evangélicas presentes foi imediata. Algumas citaram a passagem bíblica de Filipenses 4:13 para expressar sua discordância com a ideia de um protagonismo feminino desvinculado da orientação divina. Para essas líderes, o papel da mulher na sociedade não pode ser interpretado sem a lente espiritual. A fala de Janja, apesar de bem-intencionada, foi recebida como uma desconexão com os valores centrais do segmento cristão que mais cresce no Brasil.


Empatia ou estratégia? O peso do ano pré-eleitoral

Lideranças ouvidas pela reportagem apontaram que o incômodo vai além do conteúdo da fala: trata-se da forma e do momento em que o governo tenta estabelecer esse diálogo. Em pleno ano pré-eleitoral, o gesto foi interpretado por muitos como estratégico, e não sincero. A distância histórica entre o campo progressista e a pauta da família tradicional, por exemplo, continua sendo um divisor profundo. Temas como o aborto, identidade de gênero e laicidade do Estado ainda geram forte resistência nas igrejas.


Símbolos em conflito: candomblé, MTST e evangélicos conservadores

A escolha de Salvador como cenário para o discurso carrega simbolismo. A cidade é um dos berços do candomblé — religião com a qual Janja é publicamente ligada — mas também lidera o crescimento evangélico no Nordeste. Vestida com uma camisa do MTST, a primeira-dama discursou em uma igreja batista, o que gerou estranhamento entre fiéis. Para o cientista político Bruno Soller, a tentativa de dialogar com setores moderados do evangelismo não foi suficiente para apagar os sinais de contradição entre imagem e mensagem.


Religião em ascensão: a força evangélica na política nacional

Desde a redemocratização, o número de evangélicos no Brasil cresceu de 9% para quase 40% da população, segundo o IBGE. Mais do que um grupo religioso, trata-se de um bloco político em plena ascensão, com presença no Congresso, influência em políticas públicas e penetração em comunidades periféricas. A politização do púlpito, intensificada durante os anos do bolsonarismo, reforçou uma identidade coletiva baseada na fé, na moral conservadora e na oposição ao progressismo estatal.


Pontes frágeis: o risco de afastamento em vez de aproximação

O episódio em Cajazeiras evidencia um ponto central: não basta discursar para o público evangélico, é preciso compreendê-lo profundamente. Para construir pontes duradouras, o governo precisará ir além das estratégias de comunicação e investir em escuta ativa, representatividade e respeito à espiritualidade que molda a vida de milhões de brasileiros. Caso contrário, cada tentativa de aproximação pode acabar servindo apenas para aprofundar ainda mais o abismo que pretende superar.